Lucas Barros, fundador do canal Central do Trabalhismo e membro do Núcleo de Base Ação Popular Revolucionária
Quero agradecer e aplaudir, como já fiz diversas vezes anteriormente, a iniciativa da Fundação Leonel Brizola-Alberto Pasqualini (FLB-AP) de abrir um espaço de debates teóricos e políticos tão qualificados e faço um apelo inicial para que todos os militantes e dirigentes trabalhistas e socialistas do nosso PDT escrevam suas tribunas. Agitemos o debate interno sobre nossos caminhos e descaminhos e construir o verdadeiro trabalhismo brasileiro do século XXI.
A centralidade da luta do Movimento VAT
O Movimento Vida Além do Trabalho (VAT) vem fazendo um trabalho de base sensacional que pretende central o fim da escala 6×1 e a redução da jornada de trabalho para 30 horas semanais. Para entender a importância do Movimento VAT, é fundamental entender que a redução da jornada de trabalho é uma reivindicação voltada tanto para o combate ao desemprego quanto para a melhora das condições de trabalho dos empregados.
O drama do desemprego e da ampliação do exército industrial de reserva – resultado da própria dinâmica da acumulação capitalista –, seja por suas raízes estruturais ou conjunturais, tem como consequência a diminuição do nível salarial dos trabalhadores e a precarização das condições de trabalho.
Aliado a isso, no Brasil, a classe trabalhadora é vítima da superexploração do trabalho, explicada por Ruy Mauro Marini como um mecanismo particular desenhado pelas burguesias dependentes latino-americanas para reverter sua perda de lucro na relação de dependência com o primeiro mundo. Ela deve ser entendida como o mecanismo que as burguesias da periferia capitalista, sócias locais das burguesias centrais, subordinadas a estas, utilizam para compensar suas perdas nas relações econômicas internacionais.
No caso brasileiro, a escala 6×1 e a desumana jornada de trabalho são elementos centrais da consolidação da superexploração do trabalho. Aqui, a ampliação da superexploração do trabalho, tanto em relação a trabalhadores empregados quanto em relação ao exército industrial de reserva, é um fator estrutural. Ou seja, a superexploração é um mecanismo central de acumulação do capital na periferia capitalista.
Construir um debate de massas sobre melhores condições de trabalho e de vida, sobre a precarização do trabalho, sobre mais e melhores postos de trabalho e sobre a saúde dos trabalhadores é um tema intimamente ligado com o trabalhismo brasileiro.
No capitalismo, a saúde não é observada em sua integralidade. Você está saudável caso consiga trabalhar, caso esteja gerando mais-valor para ser apropriado pelos capitalistas.
Um contraponto a tal visão sobre a saúde do povo brasileiro deve deixar de lado o ponto de vista que políticas públicas no campo da saúde são, exclusivamente, a construção de novos postos de saúde e a melhoria da qualidade destes, contratação de novos médicos e profissionais da área, etc. Políticas de saúde devem ter como centralidade a atenção à prevenção, evitar e combater previamente o adoecimento. Portanto, políticas de saúde adequadas são políticas que tratem de desenvolver maior qualidade de vida, de alimentação, de descanso, de lazer, de sono, etc.
Leonel Brizola, ao construir os CIEPs, traduziu, brilhantemente, tal concepção. Boa alimentação para as crianças três vezes ao dia, exercícios físicos qualificados, cuidados médicos e odontológicos, sofisticação do intelecto cultural das crianças e muito mais. Quantas vidas foram salvas nesse processo?
Agora, diante da escala 6×1, da média de 10 a 12 horas por dia de trabalho, sem contar o tempo de ida e volta e cuidados de casa e de família, a realidade é que existe uma impossibilidade prática de dormir suficientemente, fazer exercícios físicos regularmente e cuidar da própria saúde satisfatoriamente.
Portanto, o Movimento VAT é central para pensar, para além de melhores condições de trabalho para a classe trabalhadora, maior qualidade de vida, com mais tempo para lazer, para família e descanso e, portanto, uma vida plenamente saudável.
Um chamado da história ao trabalhismo brasileiro
Fato é que a causa da redução da jornada de trabalho e do fim da escala 6×1, no Brasil, foi completamente ignorada pelas forças progressistas. Estamos no quinto governo do Partido dos Trabalhadores (PT) e a última vez que o Brasil reduziu sua jornada de trabalho foi na promulgação da Constituição Federal de 1988. O movimento progressista brasileiro não enfrentou essa luta. Ficou para trás em relação à Bolívia, Chile, Venezuela, Equador e tantos outros.
Uma das causas é a desmobilização e a despolitização permanente das forças de esquerda. Parte do sindicalismo, do movimento estudantil e dos movimentos sociais está calada diante da entrega completa do Estado brasileiro, em nome do apoio acrítico ao governo Lula. Governabilidade deve ter como eixo central a mobilização nacionalista das massas em favor do interesse nacional, e não uma militância “comportada” e sem pensamento crítico. O Movimento VAT é um exemplo sobre como influenciar na correlação de forças, um movimento que se inicia sem estrutura financeira e sem apoio algum, fura a bolha dos monopólios de mídia e do senso comum neoliberal, ganha a narrativa e cria uma convicção na sociedade brasileira em torno da necessidade de botar fim na escala 6×1.
Diante da rendição completa do governo Lula e da maioria do campo democrático-popular aos interesses privados e estrangeiros – contrários aos interesses dos trabalhadores – as forças trabalhistas irão aproveitar o crescimento do Movimento VAT e seu gigantesco potencial de fortalecimento político-ideológico dos princípios de defesa de uma legislação trabalhista forte que proteja o elo mais fraco do capitalismo, os trabalhadores? Iremos aproveitar o Movimento VAT enquanto motor pré-revolucionário – por seu potencial de organização dos trabalhadores – e a oportunidade de ser vanguarda em tal causa?
Nesse contexto, a deputada Erika Hilton (PSOL-SP) protocolou uma PEC, em conjunto com o Movimento VAT, pelo fim da escala 6×1. Quero, antes de qualquer coisa, parabenizar os deputados pedetistas Dorinaldo Malafaia, Duda Salabert e Marcos Tavares por assinarem a PEC. Vocês, nessa assinatura, honraram os princípios que norteiam nossa legenda partidária. Entretanto, estes são apenas três de dezoito deputados. Mais de 70% dos deputados do PDT vão mesmo ignorar a causa? Para além de não tomar a frente da discussão sobre o tema, nem mesmo assinam uma PEC? Me perdoem, isso é uma tragédia imensa e de dar profunda vergonha à trajetória histórica do trabalhismo brasileiro e a seus sinceros militantes, como eu.
Não espero que nenhum deputado esteja lendo isso. Mas fica meu apelo para que todos assinem a PEC. É o mínimo que podem fazer. E fica um segundo apelo para militantes e dirigentes partidários que, caso sejam ligados a algum dos deputados que ainda não assinaram a PEC, os pressionem.